Seu livro mais recente, A Arte da Guerra para Professores, completa um ano de lançamento. Quais foram as suas expectativas ao escrevê-lo?
Entre 2005 e 2006, viajando pelo país, eu visitei várias Secretarias de Educação. Decidi escrever um livro que abordasse os problemas da educação brasileira, com sugestões para os profissionais melhorarem o ensino no país. Conheci o livro A arte da guerra para gerentes, e achei uma idéia interessante para ser adaptada à educação – trabalhei os meus rascunhos em cima desse livro. O título surgiu dentro dessa filosofia – a Arte da Guerra é um livro chinês com mais de dois mil anos, e apresenta estratégias administrativas que foram adaptadas à rotina escolar.
O dia-a-dia de um professor, em sala de aula, pode ser considerado uma guerra?
Há um travamento entre o professor e o aluno, entre o professor e a metodologia, entre o professor, o Estado e o MEC. Mas guerra, no seu termo literal, não existe. O que me chamou muito a atenção é que a filosofia Sun Tzu, apresentada no livro A Arte da Guerra, explica que a vitória é conquistada por meio de estratégias sem o confronto direto. E eu trabalho isso de acordo com a minha metodologia: quando há o confronto direto na ‘guerra’ em sala de aula, quem sai perdendo são os professores.
Além da filosofia apresentada por Sun Tzu, o senhor também apresenta estratégias administrativas. Como essas estratégias podem melhorar a qualidade do ensino no Brasil?
As estratégias são voltadas mais para a gestão de pessoas e administração de conflitos. O professor precisa apresentar um perfil de autoridade, de liderança, mas deve cuidar para não cair no autoritarismo. O professor deve ser um especialista em duas áreas: execução de tarefas e trabalho sócioemocional. O especialista em tarefas é o professor em si, da didática, da metodologia. O especialista sócio-emocional é quem vai administrar a parte humana, o relacionamento professor- aluno, quem vai gerenciar os conflitos presentes na educação.
Nessas viagens às secretarias, o que o senhor verificou como os maiores problemas dentro e fora de sala de aula?
As visitas às secretarias apenas complementaram o que eu já tinha de conhecimento. Trabalhei 24 anos em sala de aula, entre 1979 e 2003, em escolas públicas e particulares. Nas Secretarias, conversava bastante com ex-professores sobre a realidade das escolas do estado. O pior problema, tanto na escola pública quanto na particular, o que mais preocupa os profissionais é a indisciplina.
Como os professores devem reagir aos problemas que os alunos apresentam?
Hoje o índice de estresse dos professores é muito elevado. Excesso de trabalho, alunos sem limites, baixa remuneração. O que o professor não deve fazer é entrar no jogo dos alunos – deve buscar entender o motivo de cada conflito, deve ser o especialista sócio-emocional que eu mencionei. Uma das coisas que eu trato no meu livro e em vários artigos é que o professor não pode bater de frente com os alunos. Ele precisa, muitas vezes, ficar calado e contar até trinta antes de tomar uma iniciativa e responder às provocações. No livro eu conto várias experiências, muitas vivida por mim mesmo – algumas que deram certo, outras que fracassaram.
O senhor fala que é chegada a hora de uma revolução da parte dos professores. Essa revolução seria exatamente do quê?
Nós somos, no país, cerca de 2 milhões de professores. A maioria está insatisfeita com a situação atual, mas não quer sair da zona de conforto e tomar uma iniciativa. Eles ficam esperando uma ação dos órgãos nacionais e da direção da escola. Quando fazem alguma coisa, é greve (que na maioria dos casos não levam a nada – são poucas as em que se consegue alguma coisa). Essa revolução seria para mudar a cultura dos próprios professores e a própria cultura da educação no Brasil. Isso é necessário, inclusive, para que as classes mais pobres possam alcançar as universidades públicas por meio de uma escola pública, e que ambas tenham qualidade de ensino.
Como o senhor se transformou em formador do Plano de Desenvolvimento da Educação – Escola?
Existe a metodologia do Plano de Desenvolvimento Nacional, e eu atuo como formador do desenvolvimento da escola. É uma metodologia que diagnostica os problemas da escola e, a partir deste diagnóstico, estabelece ações para a execução. Esse é o motivo de eu estar aqui em Curitiba: passar essa metodologia para o Estado.
Dar aula para os professores, é isso?
Para técnicos de secretarias, para diretores, coordenadores, secretarias estaduais e municipais, mas isso varia de estado para estado. No caso de Curitiba, são técnicos de secretarias do Estado, de municípios e dos núcleos estaduais do Paraná.
O senhor foi analista de projetos da área pedagógica do MEC entre janeiro de 2004 e julho de 2007. O que essa experiência lhe agregou? O que o senhor aprendeu diretamente com esse trabalho?
É um projeto internacional, financiado com recursos internacionais, voltado com ações para o ensino médio. Participando desse projeto, pude conhecer a realidade da educação em vários estados. Antes desse projeto não havia ações específicas para o ensino médio. Fomos conhecendo as necessidades, a realidade de cada Secretaria e as ações que ela queria implantar no seu Estado. Eu nunca tinha trabalhado com um projeto internacional, cresci muito tanto pessoalmente como profissionalmente.
Além de analista de o senhor também é palestrante. Qual é o maior desejo do público comum de suas palestras? Eles vão até lá buscando o quê, exatamente?
Geralmente o público é formado por pessoas voltadas à educação – a maioria professores, mas também estudantes de pedagogia e licenciatura (o meu livro é direcionado também para os estudantes, não apenas para professores). Às vezes eles buscam mais do que a gente realmente pode dar naquela palestra. Quando são palestras dentro de escolas, tenho um contato mais direto com as pessoas e dá para fugir um pouco daquele tema que fui abordar. Mas eu trabalho muito nas minhas palestras com a reflexão do professor. O professor não é um coitadinho, ele pode agir, ele tem poder de influência, ele pode correr atrás. Também abordo o trabalho em equipe – nós somos dois milhões de profissionais da educação em todo o país, não é pouca gente.
O senhor já foi professor de escola pública e de escola particular. Quais são as maiores diferenças entre o ensino público e o privado no Brasil?
A diferença maior é a própria qualidade da educação básica (ensino fundamental e médio) e a falta de recursos dentro das escolas públicas. Os salários variam de estado para estado – às vezes um município paga mais do que uma escola particular. Em relação aos problemas da escola particular e da pública, eles são praticamente os mesmos, independente de nível social dos estudantes – indisciplina, falta de limites.
Na sua página na internet existem vários artigos voltados à área educacional, e também contos e poemas. O senhor se considera mais um educador ou mais um escritor?
Eu comecei a escrever antes de dar aulas profissionalmente – quando criança eu já dava aulas, brincando. O meu primeiro livro foi escrito quando eu tinha 11 anos de idade, mas meu coração é de educador. Eu não estou mais na sala de aula, mas para tudo ainda sou o Professor Maurício. Pegando um comentário de uma leitora minha no site, eu transito de um para o outro com facilidade. Do poema, soneto, haikai, conto, vou para a parte da educação – artigos, ensaios. Eu não me prendo a uma linha específica da educação, minha visão é mais ampla.
O senhor se considera um conspirador na concepção de Rubem Alves. Como é o professor Maurício Apolinário como conspirador?
Primeiro, vou explicar como o Rubem Alves define um conspirador. Às vezes ele pode não agir diretamente, mas vai colocando a sua posição, levando outros a refletir sobre determinados assuntos. Não quer dizer que eu seja alguém de esquerda ou de direita em termos de ideologia político-partidária. Eu sou educador, precisamente não sou vinculado a nenhuma dessas posições. Mas quando eu li o texto de Rubem Alves numa revista voltada para a educação, me vi ali, me enquadrei naquele contexto. Ele colocava a visão de que o professor não tem o poder de interferir diretamente no foco, mas vai minando com suas idéias, com seu trabalho, buscando melhorar a educação no Brasil.
Então todo professor deve ser um conspirador?
Deveria. É por isso que eu abordo a questão da revolução. No meu livro, em um dos últimos artigos, eu inclusive aconselho os professores a não serem voltados com fanatismos para ideologias – político-partidárias, religiosas (apesar de eu ser evangélico eu penso dessa forma). Quanto mais neutro ele for em relação a suas ideologias, melhor ele contribui na formação de um cidadão mais crítico, mais reflexivo.
Fonte: www.nota10.com.br
Acessado em 09/06/2008